Dreams are renewable. No matter what our age or condition, there are still untapped possibilities within us and new beauty waiting to be born.

-Dale Turner-

sábado, 11 de dezembro de 2010

Nous aurons pour nous l'éternité



Bom gosto da flor.

   Era o dezembro mais estranho que ela já tinha visto. Noites chuvosas, dias quentes. A exceção daquele. O sol quis aparecer, teimoso em meio a tantas nuvens. A menina de cabelos cacheados estava deitada no sofá da sala quando resolveu que hoje não ficaria em casa remoendo lembranças antigas. Levantou, calçou seus tênis, procurou os óculos escuros, apanhou a coleira do cachorro e saiu pra um pequeno passeio. Caminhou até a praça próxima de casa e deixou que o animal, que hoje era sua única e mais fiel companhia, corresse um pouco. Ela se sentou embaixo de uma arvore e começou a sentir o vento morno que corria. Olhando aquele cenário, sentindo aquele ar e aquelas cores, ela percebeu que todas as lembranças, que ela havia tentado deixar trancadas dentro do apartamento, sabiam o caminho daquele lugar.
  Com o final da tarde, veio a chuva fina típica daquela estação. Ela ficaria ali se refrescando por muito tempo se não tivesse se lembrado que havia deixado a janela da sala aberta. Chamou o cão e refez o caminho até em casa. Aquela chuva tinha feito bem aos dois, voltavam para casas um tanto mais felizes, ou menos tristes.
  Quando a porta do elevador abriu, o cachorro correu e pulou alegre no colo de uma menina que estava sentada no chão e encostada na porta de entrada da sua casa.
 - Oi, Amorzinho! Você não me esqueceu, não é? IIh você ta todo molhado... – Ela parou de falar e olhou pra cima, para os olhos surpresos da outra. Ela estava parada, inerte e molhando todo o corredor. Sem saber o que pensar, ela estudava cada pedaço do corpo que um dia conheceu. Os cabelos escuros mais curtos, não brilhavam como antes. Ela estava sem maquiagem e mais magra. Mas o que mais incomodou foram os olhos, eles estavam tristes... Muito tristes.
  Ela caminhou até a porta devagar, abriu e ficou esperando até que a outra se levantasse e entrasse. Quando ela passou pela porta pode ver seus olhos brilharem. Ela trancou a porta e passou direto até o banheiro. Apanhou duas toalhas secas. Colocou uma no chão, onde o cachorro se deitou, e começou a secar os cabelos com a outra devagar, numa tentativa de se dar tempo pra pensar no que fazer.  Trocou a roupa molhada, sentou na cama por alguns segundos, fechou os olhos e respirou bem fundo, tomou toda a coragem necessária e voltou pra sala. Sentou no sofá e ficou observando a outra que caminhava entre os móveis, tocando um e outro objeto com carinho. Olhou pra trás sorriu e disse:
  - Senti saudade de tudo isso sabia? Está tudo nos lugares onde eu me recordo, menos as nossas fotos. – As últimas palavras foram ditas em notas um pouco mais tristes.
 - Você realmente pensou que as encontraria no lugar?
- Na verdade eu esperei encontrar outras... – ela se sentou a uma distância razoável.
- Talvez fosse melhor, mesmo.
- Isso eu não sei, na verdade.
  Houve alguns segundos de silêncio, em que ela sentiu raiva. Questionava como as pessoas conseguiam fazer isso. Ir embora, voltar tempos depois como se nada tivesse acontecido. Parecia um tanto cruel. Ela havia sofrido muito com tudo isso, ainda doía. Toda a mágica de antes tinha virado tragédia e ela sabia que a culpa não tinha sido dela. Era a outra quem tinha perdido e ela teve tempo pra pensar, ir se preparando pra se caso esse dia viesse a acontecer. Mas de repente ela percebeu que de nada havia valido. Ela estava lá desarmada, tinha esquecido tudo o que tinha pra dizer.
- Por que... O que você veio fazer aqui? As coisas que você deixou estão guardadas, pensei que talvez você fosse querer buscar, mas eu poderia ter mandado pelo correio...
- Não. Não foi por elas que eu voltei. – Olhou fundo nos olhos da outra, esticou a mão tentando alcançar a dela, mas ela se levantou, deu um passo pra trás e cruzou os braços enquanto acusava a outra com os olhos.
 - Será que tem mais alguma coisa pra você? Achei que você tivesse levado tudo o que realmente precisava quando passou por aquela porta há uns meses atrás.
- Tenta entender, por favor.- Ela tinha fechado os olhos - Eu cometi um erro, mas eu fui atrás de um sonho. Eu reconheci o meu erro quando entrei naquele ônibus e quis voltar, mas ai já era tarde. Eu resolvi apostar e perdi.
- Pelo o que sei, você tinha casa no Rio, estava bem empregada.- A outra olhou surpresa e ela corou um pouco. Não queria que ela pensasse que ela esteve preocupada demais com o bem estar dela. – Pois é, as pessoas se preocuparam esses meses todos em me contar sobre a sua vida maravilhosa.- E deu de ombros.
- Mas eu perdi, perdi a nossa casa, perdi o nosso cachorro, perdi o seu amor, perdi você...
- Foi porque você quis assim! – Disse entre lágrimas num tom bem mais alto. – Eu não te mandei sair. Você deve achar justo voltar agora que eu resolvi apagar as suas memórias que me atormentaram todos os dias. Você é bem grandinha pra saber o quanto dói aqui, o quanto eu lutei do seu lado por tudo isso aqui e mesmo assim foi embora sem ter nem a decência de me olhar nos olhos, deixando um bilhete de desculpas?
  A outra abaixou a cabeça nos joelhos e começou a chorar, um choro sentindo daqueles que agente sabe que esteve guardado muito, muito tempo. A raiva se dissipou vendo aquela cena. Tinha tempo que ela não a via chorando, mas por algum motivo, agora doía muito mais.
- Desculpa, eu não tinha direito de te fazer reviver tudo isso. Tem muitas coisas que eu nunca te disse... Depois de tudo isso, eu ainda sinto sua falta. Eu nunca devia ter ido embora amando você como eu amava e ainda amo. Só não tenha raiva de mim... – Não pode mais falar, a voz foi embargada pelo choro. Ela se levantou e tomou o caminho da porta.
Vendo-a partir, teve pouco tempo pra pensar. Poucos segundo pra muitos sentimentos distintos: Confusão, descontrole, perda... Deu dois passos rápidos e segurou-a num abraço.
- Não! Eu não suportaria ver você indo outra vez. Eu ainda sinto raiva, mas meus outros sentimentos me ensinaram que amor de verdade não se impede de sentir isso também. Por favor, fica. Fica e não se perde de mim outra vez. Eu... Eu te amo!
  Ela se virou e segurou o rosto da mulher que amava com as duas mãos e a beijou. Um beijo com gosto de saudade, com gosto de retorno, com gosto da certeza de que o que não tem que acabar simplesmente não acaba.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Laissez-le-moi


    Foram inacreditáveis doze meses em que derramei aqui minhas emoções... Dividi momentos meus que nem mesmo eu ainda pude viver, mas posso dizer que ainda assim são os mais verdadeiros. Obrigada a todos aqueles que se deram o trabalho de ler estas linhas. Espero trazer alguma felicidade por mais tempo... =] 
AnaCii

Agora tem até musiquinha =]

     Era outro 24 de Novembro. O dia havia nascido meio cinza, mas ainda assim aquele dia se fazia lindo. Eu estava sentada no chão da sala, apoiando as costas no sofá amarelo que eu sempre detestei tanto. Olhava pela janela o pouco de céu que aquele quadrado me permitia, mas que tinha poder pra me levar pra mais longe do que minhas pernas ou meu coração teriam coragem de carregar. Largado no chão, o notebook esperava ansioso com uma página em branco por qualquer coisa, mas simplesmente não havia nada a dizer. Os pensamentos, sempre tão embaralhados e voluntariosos, de repente emudeceram. Levantei e fui até a cozinha, peguei uma xícara grande de café, voltei a me sentar e encarar a página. Ainda assim: Nada!
  Resolvi não forçar, sempre primei pela fluidez de tudo que havia feito e hoje não seria diferente. Minimizei a tela e coloquei alguma coisa pra tocar. A voz de Edith invadiu aquele pequeno cômodo e, como de costume, meu coração começou a bater um pouco mais rápido.
  Foi então que ela apareceu. Entrou com calma, parecendo que sempre esteve ali. Os cabelos estavam um pouco mais compridos e soltos, mas os olhos que eu tanto amo estavam iguais, ainda brilhavam convidativos e ameaçadoramente lindos. Ela vestia um vestido simples, vermelho que lhe caia até um pouco abaixo dos joelhos. Veio andando se abaixou e me beijou o rosto com carinho. Veio se sentar atrás de mim. Começou a mexer em meus cabelos com carinho e perguntou:
   - O que você está fazendo ai, meu amor?
Fechei os olhos, sentia os dedos dela correndo pelo meu couro cabeludo e ia percebendo o quanto aquilo me fazia falta.
  - Tentando escrever, contar mais mentiras sobre você e eu...
Ela sorriu e o som daquela pequena gargalhada teve o poder de matizar os sentimentos em meu peito, que sempre tiveram cor, mas que de repente se fizeram mais vivas.
 - E engraçado você dizer que são mentira. Eu vejo seu rosto, eu vejo meu rosto em tudo o que você escreve. Vejo seus sonhos, nossas mãos, os meus olhos... até mesmo nos que falam de outras mulheres.
 - É verdade... É difícil me lembrar de algo em que você não está.  
Ficamos em silencio por algum tempo. Ela me abraçou. Havia mil coisas que eu queria dizer...
- Não entendo como é que a gente foi se perder tanto. Tem tantas coisas que poderíamos ter vivido... Nós confiamos no tempo e hoje eu sinto que ele me deixa cada vez mais sem saída. Estamos indo pra longe... Um longe onde eu não sei se vai dar pra voltar.
 Não deu pra falar mais muita coisa. Eu desmoronaria se tentasse e ela sabia disso. Começou a trançar meus cabelos.
- As pessoas se perdem o tempo todo. Elas se perdem e as vezes se encontram mais tarde, levando uma bagagem de vida maior, um amor mais maduro... Mas não sinto que seja assim no nosso caso. Nós nunca nos perdemos. Sempre estive aqui, sempre vou estar aqui. Mesmo que seja numa lembrança. Nós temos muitas, não é? Já são dois anos...
  - É... Dois anos.- tornei a fechar os olhos –Será que você pode ficar um pouco aqui comigo?
 - Claro, eu já te disse... sempre estou aqui.
Sorri, peguei a sua mão e a levei até o quarto. Deitadas na minha cama, eu a prendi num abraço firme, esperando que ela não fosse embora, esperando que ela ficasse ali pra sempre...
  Acordei mais tarde, sentada no chão, com o copo de café já frio ao meu lado. A sala estava impregnada com o cheiro dela, mas eu nem perdi meu tempo questionando o por que. Talvez fosse só minha alma desesperada querendo que ela tivesse mesmo vindo me ver. Corri os dedos pelo rosto, tornei a abrir a página em branco e escrevi: 
“Le temps de commencer ou de finir
Le temps d’illuminer ou de souffrir
Mon Dieu! Mon Dieu! Mon Die!
Même si j’ai tort
Laissez-le-moi um peu...
Même si j’ai tort
Laissez-le-moi
Encore...”

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Et dans tes yeux, mes jours heureux

        Hoje, meu amor, eu vim pedir sua vida. Vim pedir todos os seus sonhos em troca de um milhão de abraços nas manhãs de domingo. Vim deixar você provar tudo que é doce em mim, desde que me permita ter o que há de amargo em você. Quero poder gritar que nunca mais vou voltar e terminar nos seus braços meia hora depois. Deixar você me ensinar a colorir o infinito e te deixar ler todas as minhas entrelinhas. Sentir o perfume de maio chegar e voltar a ser criança. Escutar seu silêncio e descobrir novas canções pra te dar. E me jogar do oitavo andar só pra você me segurar. Toda vez que se perder, ir te encontrar e te trazer pela mão, não importa a distancia. Despir minha mente, fechar os olhos e te ver. Brigar pra nos reconciliarmos e tornarmos a brigar mais tarde. Ser livre e deixar a gravidade me puxar toda vez que você sorrir. E me sentir morrer por pensar que posso te perder. Vim te oferecer meu corpo em troca dos filhos que um dia me dará e prometer que irei amá-los tanto quanto meu coração consegue amar você. Envelhecer te escrevendo outras centenas de letras enfeitadas que vão construir uma história começada com “Era uma vez...”.

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Mais dans ma vie y a plein d'printemps.



 Eu tenho infindáveis sonhos que hoje parecem me perseguir. Sonhos dos quais não abro mão e ainda assim me escravizam, apontando o caminho e sublinhando os obstáculos, que por mais simples que pareçam ser se fazem intransponiveis, quase assustadores... Sonhos que hoje divido e dobram de peso a cada passo não dado. Ah, mas eu não os temo! Sonho novos sonhos todas as manhãs e os cultivo, mais do que com amor, com coragem, porque sei que o que difere fracos de fortes é a capacidade de enfrentar as própria quiméras.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Après nous


    O sábado estava frio, faltava luz no dia e as palavras pareciam ecos distantes. A visão estava turva, confusa... E ela ia refazendo os passos até em casa. Sentia que iria embora, mas antes havia coisas a serem ditas, palavras acinzentadas e coloridas que ela guardava no peito e que iam ganhando forma à medida que caminhava.
  Subiu até o sexto andar pelas escadas, tentando ganhar tempo e com ele coragem pra se despedir. A porta estava aberta como havia deixado ao sair sem olhar pra trás. Passou por ela com passos nem tão seguros, com medo do que veria lá dentro. Na sala, outra garota de vinte e poucos anos sentada numa cadeira em frente a uma enorme porta de vidro cujo reflexo permitia ver olhos inchados e avermelhados enxergando sem ver tudo o que havia lá fora num mundo de coisas não palpáveis.
  Ver aquele rosto entristecido era para ela como sentir cortar a própria carne e foi impossível controlar as lágrimas. Ela esticou o braço, pensando em tocar o ombro que muitas vezes havia lhe cedido aconchego a noite, mas algo em sua cabeça fez com que mudasse de idéia. Ela nem sabia mais o porquê de terem brigado, só sabia que não fazia sentido. Todo o texto preparado sumiu da mente, era melhor falar com o coração que parecia bater cada vez menos, falar logo...  
  - Eu voltei pra casa me perguntando como chegamos até aqui, o porquê de chegarmos até aqui... Os dias estão difíceis e me peguei pensando na tristeza das coisas que terminam, mas descobri que isso é uma grande e terrível mentira. – A outra continuava olhando impassível pela janela e ela respirando fundo, tomando fôlego pra terminar – Olha, eu sempre te amei, sempre fui sua e minha vida sempre esteve entrelaçada aos seus passos profundamente. É uma pena que isso tenha que se desfazer agora. Eu queria poder fazer você esquecer cada palavra minha que tenha te ofendido e soubesse que daria tudo para tê-las escolhido com mais carinho. Queria ter poder pra fazer sobrar na sua memória só as coisas boas que pudemos viver até aqui, mas sei que as paredes dessa casa vão tratar de fazê-lo por mim. Eu vou agora, ficar não adianta mais nada. E mesmo que eu caminhe sem você por lugares que eu desconheça, vou te guardar... Vou te levar...
 Os restos das palavras se engasgavam em meio às lágrimas que agora inundavam aquele rosto. Ela se sentou de costas para a parede com as pernas encolhidas e se deixou chorar por um tempo em busca de uma calma que nunca veio.
  O telefone tocou uma, duas, três vezes até que a menina de olhos tristes resolveu se levantar. Tirou-o do gancho sem pressa, e sua voz saiu baixa, num “alô” tão infeliz quanto seu rosto parecia estar. A conversa prosseguiu por pouco tempo, alguém do outro lado do telefone a havia assustado tanto que seu rosto perdeu a cor, seus olhos agora tinham perdido a vida e o telefone tinha escorregado pelas suas mãos. Saiu correndo pela porta aberta, desceu todos os degraus tão rápido que pareciam não estar ali, ganhou a rua com igual velocidade e no fim dela uma pequena multidão.
Dentro de sua cabeça as passadas eram feitas em câmera lenta e os pensamentos de misturavam, pesadelo, desespero, esperança...

“A morte de um ente querido é uma coisa estranha. É como subir as escadas para o seu quarto no escuro e achar que tem mais um degrau... quando não tem. O seu pé afunda no ar e acontece um breve momento de grande susto.” Lemony Snicket.

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Le ballet des coeurs


Eu descobri que troco tempo por tempo, tentando não envelhecer.
Troco de dores, mantendo tudo o que me caracteriza e faz viva.
Troco a cor dos meus cabelos, emoldurando com mudança um rosto cansado.
Troco de banda preferida, montando uma trilha sonora de mim mesma.
Troco minha própria verdade, buscando ser maior do que eu possa ser.
Troco de amores, preenchendo lacunas e tentando não errar.
Troco até de coração, então passo a ser você.

sábado, 7 de agosto de 2010

No regrets

Outro copo de vinho, mais um cigarro na mão,
Duas linhas escritas de um poema bobo.
Uma lembrança boa dançando na memória,
Um meio sorriso insistindo em aparecer...

Meio copo de vinho, o cigarro queimando,
E as lembranças chegam com vigor.
Um completo sorrir ao lembrar nossa história,
lindas linhas de um poema ebrio.

Um copo vazio e o gosto amargo do cigarro.
Gosto que lembra os lábios que me tiravam o chão.
Agora a fumaça leva tudo o que um dia foi lagrima
e me resta o cinzeiro de lembranças apagadas.

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Et moi je trouve ca merveilleux


          Eu me lembro de acordar de manhãzinha e sentir seu braço pesando em minha cintura. Era quase como sonhar... Eu gravava os seus traços em minhas retinas e quase podia contar seus cílios. A ponta dos meus dedos corria pelo seu rosto em segredo, sentindo cada milímetro de pele. A sua boca vermelha, mesmo ali quieta, ia me chamando... E eu a beijava, tendo o cuidado de não te acordar. Você se mexeu um pouco e o braço em volta de mim, puxou meu corpo pra um pouco mais perto. O seu rosto de encontro ao meu e eu ouvindo você respirar... Não queria mais dormir, queria continuar vivendo meu pequeno momento de encanto, mas isso é bobagem. Quando acordasse outra vez, continuaria sonhando, só que então seria me perdendo em seus olhos.

sexta-feira, 25 de junho de 2010

Tu n'auras pas mes yeux pour mourir



   A cidade vista de cima, o chão visto de cima... E perto, perto, cada vez mais perto, rente à pele... E uma garota acordando a noite, assustada. O corpo tremendo embaixo das cobertas e dentro do abraço apertado da namorada que dormia tão profundamente que não pode notar. Ela procurou pelo celular e viu que já eram quatro da manhã. Foi se levantando com cuidado pra não acordar o pequeno corpo ainda adormecido e aconchegado às muitas cobertas.
   Com um pouco de sorte, achou café na garrafa térmica. Encheu um copo, acendeu um cigarro e se sentou no peitoril da janela pra observar a cidade. Essa noite ela estava anormalmente quieta, tudo o que se ouvia era o vai e vem dos carros na avenida logo abaixo.Ainda assim aquela visão cheia de luzes sempre trazia calma, mas parecia que o sono havia sido espantado pra longe demais dessa vez. Resolveu se servir de algo mais forte pra tentar relaxar... Na geladeira, uma garrafa de vinho tinto pela metade. Serviu uma dose generosa e voltou a observar a calmaria.
    A essa altura não era o sonho ruim que a mantinha acordada, estava imersa em seus próprios pensamentos. A vida era boa, ela estava exatamente onde esperou estar a vida toda. Tinha tudo o que desejava ter e não precisava de ninguém pra isso. Tinha construído a fortaleza segura dos sonhos da adolescência e amadurecido com os trancos do caminho. Então porque o buraco no peito? Era um buraco tão fundo que não se podia ver o que estava dentro. Ela só sabia que pesava tanto que já não carregava e sim o arrastava.
    O telefone tocou as quatro da manhã e a arrancou de dentro dos pensamentos com um susto grande. Ela olhou o identificador e o frio na barriga foi inevitável. Já fazia tanto tempo que se assustou de ainda ter aquele número gravado na agenda e mais ainda por estar recebendo aquela chamada, mas atendeu sem nem mesmo entender porque.
-         Oi.
-         Oi, não esperava que você atendesse.
-         Então por que ligou?
-         Não sei, talvez parte de mim quisesse mesmo ouvir você...
-         Ta, mais alguma coisa?
-         Na verdade muitas coisas... E eu quero que você só me escute. Faz tempo e talvez eu tenha esperado muito, mas isso também foi bom pra eu ter certeza de todas as promessas que eu fiz pra você um dia. Eu vivi a minha vida, mas nada foi igual ou teve o mesmo gosto. Faz tempo que eu percebi que era mesmo você e que ninguém poderia ocupar o vazio que deixou em mim, mas persisti... Acho que por falta de coragem, não sei! Mas hoje eu resolvi testar a minha sorte e ligar pra dizer que eu ainda te amo... Eu ainda quero ter a minha vida do seu lado.
-         É... Tem razão, você esperou muito.- E desligou o celular.

  Quase que imediatamente o coração apertou e seus olhos se fecharam deixando cair duas lágrimas sentidas. Apertava tanto o peitoril da janela a procura de apoio que os nós dos dedos estavam brancos e ela tentava não fazer barulho. O choro que lavava seu rosto agora era do pior tipo, daqueles que você nunca vai poder dividir com ninguém. Ela detestava chorar, mas a tortura era maior que as forças que ela tinha. Sabia que tinha tomado a decisão certa, mas havia um talvez... Talvez tivesse acabado de jogar a própria felicidade por aquela janela.
  Já estava mais calma quando voltou para o quarto. O dia estava nascendo e da porta do quarto ela pode ver o corpo da mulher que dormia sozinha sem saber de nada do que havia acontecido. Talvez ela nem tivesse percebido a ausência dela na cama. Deitou, abraçou a pela cintura e tentou voltar a dormir. Pela manhã a única coisa que havia mudado era que agora sabia exatamente as feições, o nome e o número do telefone do peso dentro do buraco.

domingo, 6 de junho de 2010

Sous le ciel de Paris

      Ela se sentou no sofá da sala, colocou as pernas pra cima e segurou um copo de chocolate com as duas mãos esperando que ele as aquecesse. Olhando pela janela, via os tons pálidos de um outono mais frio do que o normal, mas ainda assim incrivelmente lindo. Talvez ele estivesse enfeitado pelos olhos dela.
      Na TV só o normal de domingo à noite, então colocou música pra ouvir. Era uma daquelas canções despretensiosas que chegam e te pegam de assalto, ainda que você já as conheça. Cantarolou um ou dois versos e sorriu imersa em pensamentos resgatados de um canto quente do próprio coração.
      Ela foi se ajeitando embaixo de um cobertor e fechou os olhos. Era incrível, podia até sentir o cheiro doce de um perfume que conhecia muito bem.
     O celular tocou num canto e ela correu até ele. Era uma mensagem que dizia: “Já falei hoje que eu te amo?”. Uma frase curta que teve o poder de aquecer seu corpo todo, preenchendo-o com a mais doce sensação de felicidade. Algumas palavras que trouxeram a primavera até aquela pequena sala e fizeram com que se sentisse sob o céu de Paris. E ela respondeu: “Ainda não...”.
     Tornou a se jogou no sofá e ficou lendo e relendo, sentindo aquela sensação gostosa na barriga, que lembra mil borboletinhas batendo assas. O dia tinha mudado, o sabor das coisas muda mesmo quando a gente ama. E foi pensando assim que caiu no sono, ali mesmo.
     Três batidas na porta da frente foram suficientes para que despertasse do sono leve. Levantou cambaleando e foi ver quem era. Quando a porta se abriu a primavera se tornou verão quente e a luz do sol vinha do sorriso da outra garota de pé na porta. A mão dela veio até seu rosto e os dedos estavam frios, mas ela não se importou. Os corpos se encontraram num abraço carregado de significado mudo e eles ficavam bem assim, amorosamente encaixados. E os corações que pareciam esperar tanto por aquele momento podiam bater compassados agora.
    Esse silêncio breve foi rompido por um sussurro mágico: ‘Eu vim pra te dizer o quanto é importante você saber que eu te amo”.

quinta-feira, 20 de maio de 2010

C'est toi qu'il me fallait


   Ela me traz a paz de sorrir sem motivo algum e o desassossego de não tê-la por perto as vinte e quatro horas do dia. Ela olha rente a minha pele e me invade pelos olhos com facilidade que assusta. Vai arrancando deles meus segredos escondidos nos cantos escuros e colocando só o rosto dela no lugar. E aos poucos vai me mostrando que a saudade que eu carregava tinha o nome dela, antes que eu a conhecesse. Ela vai me tocando o corpo e fazendo com que me acostume às suas mãos e sinta falta de um pedaço meu quando não está aqui. Vai me tirando a prudência, aquietando os medos e fazendo esquecer das dores que eu sentia. Ela sabe fazer o mundo parar quando sorri e tornar a girar quando me beija. Ela sabe fazer faltar o ar com uma lembrança e acabar com a gravidade com duas ou três palavras. Alguém me prenda no chão! Eu estou me apaixonando outra vez...

quinta-feira, 13 de maio de 2010

C'est ton tour

 Vamos, abra os braços, feche bem os olhos e confia em mim. Balança seu corpo pra frente, deixa que ele caia devagar, eu vou estar do seu lado. O vento vai vir cortar seu corpo, mas nem mesmo ele será capaz de mudar sua direção agora. Prometo que não vai fazer diferença... O homem que espera o metrô vai continuar lá, crianças ainda vão sorrir e o sol ainda vai vir pela manhã. O caminho até o chão é curto, mas não quero que tenha medo dele. Não há como prever o que vai acontecer, só esperar que no caminho você aprenda a voar. E que o sopro quente embaixo das suas asas feitas de coragem sejam os seus sonhos inconfessáveis. Eles vão te levar pra longe, pra dentro da imensidão de tudo o que teme. E eu só quero que traga de lá o seu medo de ter medo e o de nunca arriscar.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Chérie bien aimé

Ela vinha carregando as sacolas pela rua, com o olhar perdido e ares de felicidade. Passos que por bem pouco não pareciam pequenos saltos de alegria. Abriu o portão do condomínio e cumprimentou uma velhinha sorridente que caminhava por ali. Entrou no prédio, ganhou as escadas e seguiu até o fim do corredor. Apoiou as sacolas no chão e começou a procurou as chaves do apartamento.
Quando a porta se abriu, não tinha quase nada pra ver. Um grande colchão de ar, muitas caixas espalhadas, notebook, televisão, som e discos. Ela passou direto pela sala e deixou as compras na cozinha. Logo no corredor, começou a arrancar as peças de roupa do corpo e foi largando pelo caminho até o banheiro. E não pode conter a gargalhada quando percebeu que estava realizando um pequeno sonho. Ligou o som e acompanhou a canção em voz alta... “Here I am and I stand so tall, just the way I’m supposed to be.” Foi até o banheiro tomar banho com as portas abertas.
Saiu de lá em vinte minutos, vestiu algo confortável e só então foi pensar nas sacolas em cima da pia. Guardou algumas coisas na geladeira e preparou café fresco.
Apanhou um livro no chão, se deitou no colchão e começou a ler: “Se pode me prometer algo prometa que... sempre que você se sentir triste ou insegura... ou que sua fé vacilar... você vai tentar olhar pra si mesma com meus olhos. Obrigado pela honra de tê-la como esposa. Não tenho do que lamentar. Tenho muita sorte. Você foi minha vida, mas eu sou apenas um capítulo da sua. Haverá mais. Eu prometo...”. O resto da página se perdeu num sonho confuso.
Caminhava em direção à porta e quando passava por ela, sentia areia fina nos pés. O corredor era substituído por uma imensidão de água do mar, avermelhada pelo sol que se punha à frente. Ela se sentou pra observar o brilho na superfície da água pensando que aquele não era um sonho pra se ter sozinha. E como se alguém ouvisse esse pensamento, veio a menina de cabelos curtos caminhando com um sorriso em sua direção. Pronto! O sonho piegas perfeito. Mas antes que elas se encontrassem, o sonho foi interrompido por uma nota um pouco mais alta de alguém que cantava pras paredes da sala.
Sorriu, passou a mão nos cabelos e correu os olhos pelo bagunça que ela mesma fizera. Aquele lugar, aquelas caixas, espaço e tempo eram seu maior sonho real. Mas esse também era um sonho pra não se ter sozinha, pena que acordada seu pensamento não tivesse poder de realizar certos desejos.
Apanhou o computador e escreveu: “Quanto tempo sem te ver... Acabei de sonhar com você outra vez. Tô deitada na sala do apartamento novo agora. Isso aqui ta a maior bagunça rs. No final das contas eu não sei mesmo me virar sozinha... Tá faltando a sua paz pra me acompanhar...” E enviou. Não tinha nada pra perder mesmo. Quem sabe o mar adentrava a porta da sala.

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Les échos du bonheur


  O telefone tocou às duas da tarde. Era a voz de um amigo me convidando a passear pela noite, acender risadas e beber alegria, como quando éramos mais jovens e despreocupados. O engraçado é que isso não fazia muito tempo. Coloquei o telefone no gancho e saltei do sofá com alegria, cheia de esperança pela noite fantástica que certamente viria. O problema é que eu não sabia o que vestir.
  Fui até o quarto e abri as portas do guarda roupa disposta a arrancar dele algo descente pra que eu pudesse vestir. Meu sorriso animado sumiu quando contemplei a desordem natural dele. Fui puxando peça por peça e o que desagradava ia pro chão.
 Quinze minutos e nada... O guarda roupas quase vazio e eu constatando a necessidade de roupas novas. Foi então que puxei do fundo da bagunça uma camisa azul escura. Aquela mesma que eu havia escondido. Meus olhos fecharam e eu a trouxe até o nariz sem pensar, mas logo a abaixei, pois o cheiro que procurava já havia se perdido. Eu a abri na minha frente e foi como se eu pudesse reviver o dia em que eu mesma a arranquei do seu corpo. Foi como sentir novamente a luz que saia dos seus olhos, que me refletia dez vezes mais bonita do que sou, tornar a cair sobre mim.
  Eu pude lembrar de cada uma das promessas que hoje só servem pra te desconcertar, mas elas são tudo o que eu ainda sei sobre nós (mesmo que por vezes eu queira duvidar) junto com todas as coisas que não faremos, embora eu ainda esteja atada a você com nós cegos feitos pelos meus desejos insufocáveis, egoístas e cheios de amor.
  Eu corri os dedos pelo pano, mas o que eu sentia nas pontas deles era o toque da sua pele e a recordação do calor do seu corpo. Também veio a saudade da calma do seu abraço e das suas mãos correndo pelo meu rosto, desenhando os meus contornos. De olhar no fundo dos seus olhos e ouvir aquele “eu te amo” que vinha como uma onda colorida, quebrava no meu peito e fazia com que sentisse vida neste corpo. E de sentir os ecos de felicidade retumbando dentro de mim enquanto diziam “eu também, eu também... eu também”.
  Aos poucos, meus olhos tornaram a recobrar o foco e encarando aquele pedaço de pano, que mais parecia um pedaço seu deixado pra trás. Eu sorri, embolei e tornei a atirar no fundo do guarda roupas. Peguei o primeiro jeans ao alcance, uma camiseta preta e calcei meus all stars inseparáveis. Maquiei o rosto com o cuidado de sempre e dei um jeito nos cachos dos cabelos. Peguei o celular e as chaves, apaguei as luzes e tranquei a porta me perguntando se um dia teria coragem de me livrar daquela camisa de vez.

quarta-feira, 21 de abril de 2010

À l'enseigne de la Fille Sans Coeur

  Preciso poder permanecer triste por incontáveis dias sem ter que me fazer entender, não estar feliz pelo simples fato de estar. E me cansar, zombar da sua vida por não ter controle sobre ela. Será querer demais?
  Quero ir pro lado errado e rir na cara do aviso, gritar sem me esconder. E ficar por perto sem você me ver, confiar em tudo o que for novo sem nunca ter certeza. Será pedir demais?
  Tenho que saber quantos passos ainda posso dar além de toda a loucura que já cometi, pra que longe os desejos do seu coração vão me levar pra eu te ver feliz, até onde eu suporto respirar sem viver. Será poder demais?

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Les rêves que m'apportent tes yeux


  Um dia decidi seguir e ir buscar meus sorrisos em lugares distantes dos que você costumava caminhar.
  Corri por todas as estradas tortas que pareciam não ter fim e hoje tenho mil histórias pra contar sobre o que pode ser o amanhã. Mas só o que eu quero te dizer é que ele realmente não importa, assim como “o que está feito, está feito”.
  Escrevi incontáveis linhas sobre saudade e isso funcionou por algum tempo, até que eu passei a precisar do que estava dentro delas. E não foi difícil buscar, já que sempre esteve por perto e podia me sentir de alguma forma.
  E mesmo que ninguém entendesse, eu tinha paz na sua felicidade e você sorria com a minha. Aprendi a ler os seus gestos e você descobriu quem sou eu, juntas construímos uma casinha amarela com janelas e portas vermelhas pra que a nossa amizade pudesse morar. Foi mais que amor e nada que eu vá conseguir explicar. Era algo que me permitiu ter o que sempre quis livre no vento e preso nos versos das nossas canções.
  É verdade que eu andei pra longe e que, mesmo no longe, você está e ainda posso ver todos os meus sonhos desenhados em castanho escuro, dentro da íris dos teus olhos. Ah! Não sei se é certo, mas já me sinto contando os passos de volta pro seu coração.