Ela vinha carregando as sacolas pela rua, com o olhar perdido e ares de felicidade. Passos que por bem pouco não pareciam pequenos saltos de alegria. Abriu o portão do condomínio e cumprimentou uma velhinha sorridente que caminhava por ali. Entrou no prédio, ganhou as escadas e seguiu até o fim do corredor. Apoiou as sacolas no chão e começou a procurou as chaves do apartamento.
Quando a porta se abriu, não tinha quase nada pra ver. Um grande colchão de ar, muitas caixas espalhadas, notebook, televisão, som e discos. Ela passou direto pela sala e deixou as compras na cozinha. Logo no corredor, começou a arrancar as peças de roupa do corpo e foi largando pelo caminho até o banheiro. E não pode conter a gargalhada quando percebeu que estava realizando um pequeno sonho. Ligou o som e acompanhou a canção em voz alta... “Here I am and I stand so tall, just the way I’m supposed to be.” Foi até o banheiro tomar banho com as portas abertas.
Saiu de lá em vinte minutos, vestiu algo confortável e só então foi pensar nas sacolas em cima da pia. Guardou algumas coisas na geladeira e preparou café fresco.
Apanhou um livro no chão, se deitou no colchão e começou a ler: “Se pode me prometer algo prometa que... sempre que você se sentir triste ou insegura... ou que sua fé vacilar... você vai tentar olhar pra si mesma com meus olhos. Obrigado pela honra de tê-la como esposa. Não tenho do que lamentar. Tenho muita sorte. Você foi minha vida, mas eu sou apenas um capítulo da sua. Haverá mais. Eu prometo...”. O resto da página se perdeu num sonho confuso.
Caminhava em direção à porta e quando passava por ela, sentia areia fina nos pés. O corredor era substituído por uma imensidão de água do mar, avermelhada pelo sol que se punha à frente. Ela se sentou pra observar o brilho na superfície da água pensando que aquele não era um sonho pra se ter sozinha. E como se alguém ouvisse esse pensamento, veio a menina de cabelos curtos caminhando com um sorriso em sua direção. Pronto! O sonho piegas perfeito. Mas antes que elas se encontrassem, o sonho foi interrompido por uma nota um pouco mais alta de alguém que cantava pras paredes da sala.
Sorriu, passou a mão nos cabelos e correu os olhos pelo bagunça que ela mesma fizera. Aquele lugar, aquelas caixas, espaço e tempo eram seu maior sonho real. Mas esse também era um sonho pra não se ter sozinha, pena que acordada seu pensamento não tivesse poder de realizar certos desejos.
Apanhou o computador e escreveu: “Quanto tempo sem te ver... Acabei de sonhar com você outra vez. Tô deitada na sala do apartamento novo agora. Isso aqui ta a maior bagunça rs. No final das contas eu não sei mesmo me virar sozinha... Tá faltando a sua paz pra me acompanhar...” E enviou. Não tinha nada pra perder mesmo. Quem sabe o mar adentrava a porta da sala.